Quando devo buscar um tratamento psicanalítico?

As pessoas ao buscarem um tratamento psicanalítico, nas primeiras sessões, em geral na primeira, já expõe o seu sofrimento, dizendo muitas vezes de maneira bem expressiva: “estou me sentindo mal comigo mesmo”, “estou deprimido”, “não estou bem”, “estou ansioso, sem dormir, agressivo, etc.”. Um dos objetivos da psicanálise é interceder nesses relatos para que a pessoa que fala de sua queixa comece a perceber de um outro modo o seu sofrimento.

Trabalhar com a demanda do sofrimento e modificar para um processo de cura consiste em colocar em palavras os momentos e experiências nos quais a pessoa em sofrimento apenas tinha como pensamento os problemas que envolvem sua vida. Mesmo que se trate de alguém que não acredita que possa melhorar, que não espera nada de ninguém, resta uma chance, por menor que seja, de poder suscitar esse trabalho da psicanálise, pois os sintomas que temos já são a expressão de uma tentativa nossa de auto cura. Uma tentativa inábil e ineficaz, sem dúvida, mas assim mesmo uma tentativa. Os sintomas reproduzem uma cena traumática do passado, para tentar resolve-la no presente, só que no meio do caminho se deparam com o prazer e com o amor que o sujeito criou pelos seus sintomas e a situação fica em um movimento de repetição infinito, até o surgimento da presença de algum problema ou de uma forte crise emocional.

Gosto de um texto do psicanalista Waldir Périco sobre isso, em que ele descreve o processo da Psicanálise. Para ele, no primeiro momento, o sintoma aparece identificado ao nosso “jeito de ser”, faz parte de nós e, por não nos incomodar muito, vivemos mais ou menos adaptados a ele. Por ser algo no qual convivemos há muito tempo, pode ser até que, inconscientemente, seja por isso que gostamos dele. Em um segundo momento, que na maioria das vezes não sabemos o porquê, um desses sintomas aparece de forma fulminante em nós: aumento de sentimentos estranhos, noites sem dormir, dores no corpo que os médicos não identificam a causa, ou ainda medos intensos que nos paralisam sem que a gente entenda o porquê. É nesse momento, em que um sintoma não faz mais sentido para nós, que podemos procurar um suporte de quem trabalha com a psicanálise. O terceiro momento do sintoma é aquele de quem já se encontra em tratamento psicanalítico, quando estamos diante de alguém que sabe escutar o que nós não escutamos sozinhos: nossos desejos e demais sentimentos derivados dos conflitos mais íntimos dos quais não conseguimos acessar sem um suporte de outra pessoa. 

É o tempo de analisar o sintoma e descobrir o que está por trás dele. Isso se dá ao passo que estamos com alguém que pode nos escutar de uma forma muito particular, tão particular que passamos a dizer sobre aquilo que não admitíamos nem para nós mesmos e desta forma falamos de coisas que até então não eram ditas, às vezes também desdizendo outras. De palavra em palavra, começamos, aos poucos, a falar tudo, detalhes, sobre o que vivemos no passado, sobre o que estamos vivendo agora e sobre o que queremos ou não viver, ao ponto em que nos pegamos dizendo coisas que não sabíamos que sabíamos. É dizendo para o/a psicanalista, que escuta e vai assinalando o que dizemos, que vamos podendo dizer melhor o que antes não era possível compreender, aquilo que sofríamos, nossas mágoas, nossas frustrações e outras coisas que doem. É assim que, num trabalho de análise, o sintoma passa a ser dito de outras formas, até que ele não precise mais existir daquela forma sofrida inicial e a nossa vida possa ficar mais leve.

Comentários